por Cecilia Peixoto
O século XXI sobreviveu a crença de muitas pessoas do possível “fim do mundo”, o mundo não acabou, fato! A humanidade segue em evolução, construindo, descontruindo e aprimorando a História. E a mulher nesta caminhada?
Semelhante ao sankofa, ao olhar para trás é perceptível que as mulheres saíram da invisibilidade, submissão e outras amarras onde eram relegadas a seres figurativos ou no máximo coadjuvantes na sociedade. Atualmente apesar destas transformações significativas, as mulheres continuam uma árdua luta para manter e ampliar o protagonismo conquistado até então. O processo de transitoriedade da mulher de ontem até os dias de hoje foi extremamente penoso, desgastante e, em alguns casos com desfechos trágicos.
Eram educadas para serem servis, subalternas aos homens, negar e reprimir suas vontades, desejos, emoções, renunciando a própria existência em alguns casos. A busca por igualdade de gênero segue ativa, é pertinente valorizar e agradecer o legado das mulheres que nos antecederam tanto por atitudes insubmissas ao enfrentarem desafios, quanto a proposição e consolidação de mudanças.
O mês de março é muitíssimo importante por propiciar debates e alargar as discussões sobre temas que sejam significativos e relevantes em relação às questões que nos atravessam enquanto mulher, especialmente no Brasil, destacando: Equiparação de direitos, machismo, racismo institucional. Às mulheres ainda é comum uma jornada de trabalho maior de atividades, porque além da atuação laboral na área profissional que atuam, acumulam os afazeres domésticos e os cuidados com os filhos, casos os tenham.
“Nossa premissa feminista é: eu tenho valor. ”
Chimamanda Ngozi Adichie
A desigualdade de direitos e oportunidades existentes entre homens e mulheres são naturalizadas nos costumes, comportamentos, assim como na área profissional pois, ao ocuparem e desenvolverem as mesmas atividades com iguais responsabilidades, as mulheres são remuneradas com salários menores que os pagos aos homens, e, o mais grave, são passíveis de demissão ao regressarem da licença maternidade. Embora a Constituição Federal assegure a isonomia salarial como direito de todos os trabalhadores, tramita no Congresso Nacional Projeto de Lei com o intuito de equiparação obrigatória para funções e cargos idênticos entre homens e mulheres.
O machismo decorrente de uma sociedade alicerçada no sistema patriarcal é uma ideologia introjetada na estrutura das relações interpessoais onde é atribuída à mulher a condição de inferioridade em relação ao homem. As consequências do machismo geram gravíssimos impactos: físicos, psicológicos, econômicos e sociais, os quais afetam diretamente a qualidade de vida. A mulher é vista como propriedade, ser inferior, frágil e dependente, construção histórica que nos dias atuais não passam de estereótipos que induzem a falácias, haja vista que mulheres ocupam áreas e exercem funções antes disponíveis apenas para os homens com total competência.
“Temos que falar sobre libertar mentes, tanto quanto sobre libertar a sociedade”
Angela Davis
O machismo revela-se castrador ao definir modelos identitários para homens e mulheres, padrões comportamentais que norteiam a superioridade masculina centrada na força física em contraponto a “fragilidade” feminina. O machismo sobrevive nos dias atuais de forma contundente, refletido nos dados alarmantes de violência contra a mulher. Apesar do crescimento dos movimentos feministas e o recrudescimento da legislação brasileira o índice de feminicídio em nosso país cresce assustadoramente devido a masculinidade tóxica independente de faixa etária, etnia, nível acadêmico e classe social.
No Brasil, particularmente o ativismo feminino possui um capítulo especial no tocante ao recorte racial, as mulheres negras enfrentaram e enfrentam obstáculos mais complexos em decorrência de um passado nefasto da nossa História, no qual foi acrescido à mulher negra a pseudo-ideia de “objeto”, como consequência dos pilares heteronormativo patriarcal racista, no qual nossa sociedade foi projetada.
“O imaginário brasileiro, pelo racismo não concebe reconhecer que as mulheres negras são intelectuais”.
Conceição Evaristo
O racismo institucional nos atravessa escancaradamente desde a negação da nossa identidade, perpassa por nossa capacidade e competência questionadas, a ponto de sermos preteridas pelos argumentos mais tacanhos, descabidos e inverossímeis atrelado na maioria dos casos a cor da nossa epiderme negra. É corriqueiro mulheres negras serem subestimadas pelos padrões étnicos preestabelecidos como ideal, falta de competência e, em alguns casos tê-la que comprovar diariamente.
É importantíssimo no 08 de março além de renovar ou acrescer novas pautas reconhecer e divulgar as conquistas das mulheres no decorrer do tempo, assim como estimular a transformação da sociedade através da exigência de políticas públicas que estimulem a igualdade de gênero, incluindo na participação das mulheres nas esferas de poder, fortalecer os movimentos de mulheres e o movimento negro.
Cabe ressaltar a relevância do papel tanto da educação doméstica e da educação formal. É salutar no trato familiar discutir e mudar os padrões que estimulem a superioridade dos meninos em relação as meninas, em relação a educação formal é prudente em todos os níveis acadêmicos incluir nas grades curriculares das disciplinas conteúdos correlatos a paridade de gênero. A palavra que norteia as pautas do 08 de março é RESPEITO, aos espaços da mulher, seus corpos e subjetividade, para que possamos conviver em uma sociedade mais justa e igualitária.
“… eu sou uma feminista e todas nós deveríamos ser feministas, porque o feminismo é uma palavra para igualdade”
Malala Yousafzai
Cecília Peixoto – Educadora, poeta,escritora